A política, o meio ambiente e a biodiversidade

Em geral, há certos temas que fazem parte do discurso da ala direita da política, outros pertencem à esquerda e, ainda outros andam ali mais ou menos pelo meio, partilhados por uns e por outros. Isto é, obviamente, uma forma um pouco simplista de ver a política mas não foge muito à realidade. No entanto, o tempo avança e o discurso político vai-se adaptando aos novos ventos que varrem a sociedade humana e quando um determinado assunto se torna mais normalizado, os partidos à esquerda ou à direita, tendem a absorvê-lo (ainda que, originalmente, não fizesse parte do seu discurso). Ou seja, os partidos tendem a abrir-se em relação às mudanças que vão acontecendo na sociedade.

A sociedade humana não é estática mas sim dinâmica devido a factores internos ou externos, venham esses da parte económica, da parte social, da parte ambiental ou de qualquer outra parte. E é natural que os partidos, sendo também entidades dinâmicas, absorvam as ideias que se vão adaptando ao momento actual e futuro de curto e médio prazo que, segundo eles, a sociedade humana irá necessitar.

Sabemos bem que está também em causa conseguir a maior quantidade de votos possível e isso pode ser uma razão para que os partidos absorvam ideias diferentes e vão avançando mais ou menos em conjunto com as ideias que se vão tornando comuns na sociedade. Não esqueçamos que os partidos políticos funcionam um pouco como os produtos que encontramos à venda e que precisam de consumidores para os comprarem. Os partidos precisam de humanos que votem neles para que possam pôr em prática as suas ideias de governo.

Há, sem dúvida, uns quantos partidos políticos que vivem numa espécie de dogma e que se mantêm mais ou menos fiéis às ideias que, originalmente, faziam parte do seu discurso temático e, para esses, pode ser mais complicado absorverem ideias diferentes daquelas que os formaram. E há outros partidos que baseiam o seu discurso numa forma mais popular, de modo a dizerem aos eleitores aquilo que esses querem ouvir. Mas tentemos manter este texto num ponto mais equilibrado do espectro político.

Afirmei, no início, que há temas que se inclinam mais para a direita política e outros mais para a esquerda. E completei, dizendo que os partidos tendem a absorver para o seu programa ideias que, originalmente, não faziam parte do seu discurso mas que, ao longo do tempo, se foram normalizando na sociedade humana. Algumas destas ideias entram na política pela sua parte esquerda e outras entram pela parte direita.

Os temas do ambiente e da necessidade de preservação da biodiversidade foram surgindo ao longo das décadas mais recentes e, actualmente, normalizaram-se no nosso mundo e, como tal, já fazem parte do discurso político de diversos partidos, mais à esquerda ou mais à direita, ainda que vários deles andem apenas em torno do aquecimento global, esquecendo-se dos outros problemas.

Tendencialmente, podemos considerar que os temas do ambiente e da biodiversidade estão mais apegados à parte da esquerda. No entanto, e na minha opinião, dada a importância global que este tipo de temas possui, não apenas para a espécie humana mas também para todas as outras que, connosco, partilham a Terra, parece-me de bom-tom que todos os partidos, de esquerda, de direita e do meio, sem excepção, os incluam nos seus programas e os levem a sério. E que, além disso, incluam outros assuntos que não apenas o aquecimento global. Há muitos por onde escolherem e que vão desde o enorme declínio populacional dos insectos que estamos a atravessar, até à pesca excessiva, passando por muitos outros.

Claro que o discurso político está muito preso a uma oferta de melhores condições de vida e de crescimento económico. Estão em causa empregos, receitas de impostos, aumentos salariais, crescimento económico das empresas, bom acesso à educação e aos cuidados de saúde, segurança… Enfim, vários assuntos que se relacionam com aquilo que os eleitores (num sentido abstracto) entendem como boa governação de um país ou de um concelho ou de uma freguesia (para manter os nomes usados em Portugal). E os partidos políticos tendem a apresentar programas que se baseiam na oferta dessa proposta de boa governação, tendo também a necessidade de manterem os eleitores satisfeitos com aquilo que se propõem fazer (antes de serem governo e durante esse período). Se os eleitores não ficarem satisfeitos com o que um determinado partido se propõe fazer ou está a fazer, esse mesmo partido poderá não obter um resultado de sucesso nas eleições seguintes ou, em alternativa, poderá deixar de ser governo nas eleições seguintes.

Ora, os partidos políticos apresentam propostas de gestão para a sociedade humana na qual se inserem. Essa sociedade chama-se país, concelho ou freguesia e termina na fronteira de cada uma dessas regiões administrativas. E, como se espera, no interior de cada uma dessas regiões residem os humanos, que são o alvo do discurso político apresentado. Porém, não são apenas humanos que aí residem porque isso só seria possível se esses fossem a única espécie que habita o planeta Terra. Mas da mesma maneira que o planeta é partilhado por todas as espécies que nele habitam, também os países, os concelhos e as freguesias são partilhados por todas as espécies que habitam nesses territórios.

Até se compreende que os partidos políticos façam da causa humana o objectivo do seu discurso e do seu programa. Mais não seja porque a política é uma forma criada pelos humanos para governar uma sociedade de humanos e para eles destinada. Mas se olharmos para outras espécies, encontramos também formas de governar uma sociedade. As formigas e os leões são exemplos mas há muitos mais.

Claro que não se espera que um melro, um pinheiro ou um veado vote nas eleições seguintes dos humanos de modo a eleger um determinado partido para gerir o território que habita. Mas espera-se que os humanos que habitam no mesmo território desse melro, desse pinheiro e desse veado não sejam causadores da destruição de ecossistemas e da redução da biodiversidade. E é aqui que entra (ou deve entrar) o programa e as propostas que os partidos políticos apresentam para gerir o território limitado pelas fronteiras. É óbvio que as fronteiras criadas pelos humanos e para os humanos são linhas imaginárias e nada dizem às outras espécies porque essas têm as suas próprias fronteiras. Quer isto dizer que o território de um determinado indivíduo (ou grupos de indivíduos) de uma determinada espécie pode abranger mais do que um concelho e deve ser motivo de preservação para cada um dos concelhos envolvidos.

Os partidos políticos devem continuar a apresentar as suas propostas de gestão, baseando o seu discurso na espécie humana mas devem também ter em atenção as outras espécies que partilham o mesmo território. Gerir uma região administrativa é também cuidar dos valores que são a biodiversidade residente e o meio ambiente (sendo que a espécie humana faz parte da biodiversidade residente). Gerir uma região administrativa é cuidar do valor que são os ecossistemas naturais desse local.

A sociedade humana assenta a sua condução no dinheiro e no crescimento económico o que, por si só, parece-me bem. O problema surge quando olhamos para onde quer que seja e a única coisa que vemos é a rentabilização financeira e respectivas consequências para o crescimento económico da população humana que essa coisa para onde olhamos pode fornecer. E, muitas vezes, é aqui que cai a destruição de ecossistemas e a redução da biodiversidade. Imaginemos um exemplo.

Suponhamos que ali, naquele concelho, existe a possibilidade de exploração económica através da criação de uma mina que tem o objectivo de extrair uma determinada matéria-prima para posterior aplicação num determinado equipamento. Para que possa ser possível criar essa mina é, primeiro, necessário expropriar as terras a quem as pertence, muitas vezes nas respectivas famílias há várias gerações. Terras que, por exemplo, serviam para agricultura ou para pastoreio.

Feita a expropriação que, de uma maneira ou de outra, avança, inicia-se, tempos depois, a actividade mineira que, através das substâncias utilizadas, irá contaminar o solo, a água e o ar, degradando e destruindo os ecossistemas do local e contribuindo para a redução da biodiversidade.

E aquilo que temos neste exemplo é a destruição dos ecossistemas naturais e é o empurrar de diversas espécies para o caminho da extinção. E, infelizmente, este cenário de trocar moedas por vidas de outras espécies é algo que acontece um pouco por todo o mundo.

Os ecossistemas naturais e as espécies que vivem connosco não são um cenário como aqueles que encontramos nas peças de teatro ou nos filmes que vemos na televisão. São, em vez disso, reais. São seres vivos, são vidas. Mas são vidas que, frequentemente, são trocadas por petróleo, por lítio, por óleo de palma e por uma série de outros produtos.

As propostas apresentadas pelos partidos políticos devem ir além da questão financeira que, obviamente, é importante mas não é tudo. É preciso haver um ponto de equilíbrio na gestão de cada região administrativa e é preciso dar a devida importância à preservação dos ecossistemas naturais e da biodiversidade. Mas, frequentemente, a balança desequilibra-se para o lado da rentabilização económica em detrimento da conservação dos ecossistemas naturais e da preservação da biodiversidade.

E nem sempre está em causa a criação de uma mina ou de qualquer outro tipo de actividade económica. Por vezes, sabemos de uma freguesia que anuncia ter criado algo com o nome de parque verde ou jardim urbano ou qualquer outro nome mas esses locais anunciados são, em geral, estéreis ou quase estéreis em termos de vida. São pouco mais que um relvado com umas árvores (algo que pode fazer as delícias de alguns seres humanos que até poderão, nas eleições seguintes, votar no partido que criou o relvado). Esse parque verde ou jardim urbano ou seja o que for, não apareceu do nada. Ele teve de ser criado e para tal poderão ter sido destruídos uns quantos ecossistemas naturais.

Nos tempos actuais é já possível criar e fazer crescer negócios cujo impacto no ambiente e na biodiversidade é reduzido. E é importante que os concelhos e as freguesias tentem trazer para os seus territórios esse tipo de negócios em detrimento daqueles que são destrutivos dos ecossistemas naturais e da biodiversidade. É, obviamente, necessário que haja vontade para a criação desse tipo de iniciativas, tanto da parte dos partidos políticos, como da parte das empresas e também da parte dos eleitores. É importante para todos de todas as espécies (incluindo a humana) a criação de um ambiente saudável e pleno de biodiversidade na freguesia, no concelho, no país, no continente e no mundo.

Os princípios que minimizam (ou até eliminam) o impacto negativo que a espécie humana tem tido no ambiente e na biodiversidade devem abranger todo o espectro político porque é possível ser-se de esquerda e apoiar decisões que sejam favoráveis à criação de um meio ambiente mais saudável e à preservação da biodiversidade, mas também é possível sermos de direita ou liberais e apoiar essas mesmas decisões.

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